Abrir o capital na Bolsa de Valores é um dos atestados de sucesso que uma companhia pode desejar. No Brasil, no entanto, chegar à Bolsa é um privilégio. Enquanto nos Estados Unidos existem mais de 6.000 companhias com ações negociadas, a quantidade de empresas listadas na Ibovespa é atualmente 418. Em anos tão atípicos como 2020 e 2021, em que a pandemia paralisou o mundo, o Brasil registrou 66 estreias de empresas na Bolsa, os IPOs. Parece pouco, mas essa quantidade perde apenas para os anos de 2006 e 2007, quando o país crescia 5% ao ano. Cerca de outras 50 empresas estão na fila para IPO.
No caminho inverso a esse movimento a VCI SA quitou todos seus R$ 48 milhões em debêntures com 28 meses de antecedência, recolheu todos os papéis em circulação e solicitou à CVM o cancelamento voluntário de seu registro na B3, fechando assim seu capital. Após a comprovação de que seus balanços e obrigatoriedades estarem regulares, a solicitação foi acatada esta semana pela CVM.
Qual a lógica por trás disso?
A VCI é uma incorporadora e desenvolvedora de projetos multipropriedade com marcas hoteleiras internacionais como a americana Hard Rock Hotel. A maioria dos IPOs visa a venda de parte do capital para aquisições ou expansões orgânicas e, no caso da VCI, a expansão e pipeline dos 10 terrenos já estava toda adquirida e solucionada, portanto não haveria necessidade de capital para tal finalidade.
Na outra ponta o sucesso dos projetos Residence Club at the Hard Rock Hotel, em Fortaleza, na praia de Lagoinha, e em Ilha do Sol, numa ilha fluvial perto de Londrina, geraram mais de R$ 900 milhões em vendas, caixa suficiente para a realização das obras.
A Bolsa brasileira tem realmente mais foco para commodities, empresas de internet ou empresas de varejo que possuem uma contabilidade mais simples e intuitiva e de fácil compreensão para os investidores e técnicos analistas. “Existem poucos investidores para projetos em desenvolvimento ou venture capital. A contabilidade brasileira não entende e não captura, por exemplo, as aquisições de distress asset e isso joga o valuation das empresas inovadoras para baixo. Se a empresa compra algo que vale 100 por 10, aqui no Brasil vale 10” explica, Samuel Sicchierolli, sócio controlador e Presidente da VCI SA.
O termo distress asset, equivale a compra oportunística de ativos por valor abaixo do custo em um movimento que traz grande valorização financeira caso a estratégia funcione. Claro que esse risco muitas vezes não é bem compreendido por analistas, o que dificulta a percepção correta da avaliação da empresa num ambiente de Bolsa, e o sistema de contabilidade brasileiro segue princípios desatualizados comparado aos EUA e à Ásia.
No caso a VCI SA fez movimentos considerados muito agressivos e ousados no mercado imobiliário – ao adquirir dois projetos, no Ceará e no Paraná, que estavam com obras inacabadas e com problemas, transformando os equipamentos em projetos de multipropriedade com a marca Hard Rock Hotel, e ao fazer um turn around considerado como ficção para alguns analistas, que acabou se tornando uma referência para o mercado.